20 anos prestando apoio às famílias e usuários de álcool e outras drogas, Aluísio Palhares fala sobre os trabalhos à frente da Associação Mãe Admirável e o perfil destas pessoas que buscam ajuda na instituição
CARATINGA– Em 1997, cedendo ao apelo de várias pessoas vitimadas pelas drogas, Aluísio Motta Palhares iniciou o trabalho de apoio às famílias de usuários de álcool e outras drogas através do Núcleo de Apoio às Famílias de Toxicômanos e Alcoólatras (NAFTA). Em abril de 1999 foi constituída a Associação Mãe Admirável (AMA), sendo que em fevereiro de 2000, iniciou-se a construção da Comunidade Terapêutica. A capacidade de atendimento era para doze pessoas, hoje 30 pessoas podem ser acolhidas. “É a nossa capacidade. Mas, a demanda é muita”, afirma.
20 anos realizando esse trabalho e 17 anos especificamente na AMA, Aluísio faz um paralelo sobre os trabalhos desenvolvidos e os desafios enfrentados. Uma verba que a instituição recebia do Governo do Estado foi dividida por quatro: a própria Mãe Admirável e mais três. O recurso era responsável por cobrir praticamente todas as despesas básicas e, ainda que com a redução do valor, o convênio ainda não foi celebrado. Por isso, tem sido necessário buscar outras fontes de recurso.
Nesta entrevista, Aluísio fala sobre esta situação e o perfil das pessoas que procuram ajuda na AMA, para se livrar do vício e retornar recuperado à sociedade.
Como está a situação do convênio celebrado entre a AMA e o Governo do Estado em 2011?
Esse convênio destinou-se às comunidades terapêuticas que compõem a rede que existe no estado. Essa rede é composta por pouco mais de 20 comunidades, a Mãe Admirável é uma delas. Dessas, sete tinham um conveniamento pleno, ou seja, havia pelo estado o custeio das despesas básicas que incluem salários, encargos sociais, alimentação, transporte, luz, água, telefone, aluguel; ao longo desses anos, até agosto de 2017. Foi quando terminou o prazo de vigência e o estado publicou outro edital. Participamos, fomos aprovados até em primeiro lugar no nosso eixo, porém, ainda não foi publicado. Ainda não foi celebrado o convênio em si e ainda que for celebrado, o recurso é a quarta parte do valor.
Como a instituição tem se mantido sem este recurso?
Ao longo desses anos nunca houve um reajuste. Então fomos gerando economia, diminuímos até número da equipe para que esse dinheiro fosse suficiente. É um desafio manter um trabalho desses com equipe competente com psicólogo, enfermeiro, nutricionista, agentes comunitários, pessoal do administrativo e ainda garantir a qualidade da alimentação. Nossos agentes trabalham na escala 12×36, temos os vigias noturnos, que tem adicional. Estamos buscando em alternativas, a manutenção do serviço, porque nosso objetivo é continuar oferecendo tratamento também para as pessoas que não podem, nosso tratamento é gratuito. Então, estamos buscando recursos para manter para as pessoas que querem, porque a nossa internação é voluntária. Estamos preenchendo essa lacuna vivendo de economias passadas e de campanhas. Estamos buscando, não estamos parados. Por exemplo, o Judiciário abriu aquele edital das instituições, fizemos um projeto da formação de um viveiro de mudas de café, temos uma engenheira agrônoma, a gente começa a venda das mudas que vão dar o retorno. Aumentamos a produção de galinhas poedeiras, dos ovos e do artesanato. E estamos buscando os municípios da microrregião, pois realizamos atendimentos em toda essa área.
Qual a média de permanência dos internados na AMA?
É de sete meses. É o período de tratamento com a desintoxicação, a reeducação e depois a gente trabalha a reinserção.
O perfil de faixa etária mudou com o passar dos anos?
Sim, de 2004 a 2005 para cá, quando a incidência do crack aumentou, essa faixa etária foi diminuindo, porque antes vamos dizer assim no ‘fundo do poço’, o interesse da pessoa era mais maduro. Por isso que é mais difícil trabalhar com o menor, nós não trabalhamos com menores porque a internação voluntária de menor é difícil de acontecer. Ainda está muito novo, tem muito vigor físico. Então hoje a faixa etária predominante está em torno de 25 e 35 anos. Mas, têm pessoas com mais idade, assim como tem de 18 ou 19 anos, pois alguns têm o despertar mais cedo.
Há dados sobre pessoas que se recuperaram ou voltaram ao vício?
Ao longo desses anos, quando a gente olha vê um número significativo de pessoas que após o tratamento se mantém. Na própria cidade de Caratinga tem vários exemplos. Isso é fantástico, nos anima a continuar. E um fator importante quando se fala disso não é só em relação ao dependente, mas para o codependente, que é a família, que muitas vezes se vê sem ter onde recorrer. Têm os grupos de apoio que acho extremamente importante. A gente também oferece esse apoio à família, durante o tratamento tem dois domingos que eles fazem a visita lá na fazenda e um desses domingos tem o grupo de apoio com psicólogo, enfermeiro, para orientá-los. A família também se fortalece nesse momento, mesmo que haja uma recaída, tanto o dependente quanto o familiar já estarão mais preparados, pois já tiveram um período de fortalecimento.
A recaída faz parte do processo de restauração do dependente?
Para a pessoa que é doente…. Porque é doença. Alcoolismo e drogadição são doenças. E esses doentes têm uma determinante que se não for seguida, a recaída é certa. Eles são impotentes, não podem nem um trago, nem um gole, nem o contato com a substância. Então tem que evitar até o ambiente.
E quais são os perigos deste universo chegar aos adolescentes?
Tem algo que se passa muito desapercebido quando se fala sobre droga lícita e ilícita. Na droga lícita, vão se lembrar da bebida e do cigarro. Tudo bem é lícita, mas com um detalhe: para maior. E isso não é observado. Outro dia mesmo eu palestrava para menores e perguntei para eles: ‘Bebida alcoólica é proibida ou não por lei? ’. Responderam: ‘É permitido’. Fiz a pergunta: ‘Para menor é? ’. Responderam que não. Questionei: ‘Mas, se vocês quiserem conseguem?’. Todos levantaram a mão. E quase em todos os comércios se formos olhar, então tem que aumentar a fiscalização. E também dentro da própria casa, os pais não têm noção do perigo que estão expondo, às vezes com o argumento de que ‘estão sob meu olhar’, ‘está dentro de casa’. Você não sabe o grau de tolerância daquela pessoa, às vezes já tem uma predisposição genética, o corpo e mente estão em formação.
O que é preciso para se internar na AMA?
Pode ser por telefone ou pessoalmente no nosso Centro de Atendimento, que fica no prédio do Bradesco, sala 102. Porém, quando a pessoa vai para primeira entrevista a gente tem uma lista do básico, que são exames de sangue, consulta médica, exame odontológico porque lá não tenho farmácia, médico e dentista. E existe uma lei que determina como comportar estas instituições, o chamado Marco Regulatório. Ela traz todas essas exigências e nós somos fiscalizados. Quando você pede esses exames, já está começando o tratamento. Como posso acolher uma pessoa que não faz esses exames básicos e levar para dentro de uma Comunidade, para viver com os outros? Pode ter uma doença infectocontagiosa, não é que estamos querendo barrar, mas querendo cuidar. Então a gente procura fazer tudo que determina a lei e as normas.
Um comentário
luiz
marcante trabalho de Aluisio & equipe. merece todo auxilio possivel, seja dos orgãos governamentais, ou mesmo da sociedade caratinguense. prefeitura poderia fazer o dia PHN AMA, e doar um dia de um tributo pelo menos, para AMA. sou prova viva da eficácia deles.
Luiz