* Marilene Godinho
Toda moeda tem duas faces. Na arte de conviver, essa moeda é de ouro e, quando bem usada, paga dívidas, conquista amigos e nos faz mais felizes.
A primeira face é a Palavra Boa. Lembrar que a palavra, o riso e a criatividade (transformar o que se aprendeu em conhecimentos novos) são dons que somente o ser humano os possui. Portanto, usá-los bem só nos favorece.
A palavra, por excelência, e por sua importância na comunicação, pode edificar ou derrubar. Seu poder é faca de dois gumes, como nos adverte o escritor Elias José: “A palavra pode ser devastadora e pode ser salvadora, pode construir e destruir. Ela é cheia de mistérios, azedume e doçura, liberdade e prisão, verdade e mentira, alegria e tristeza, voo livre e perigo. Ela vive na pena dos poetas, nas conversas dos namorados, nas mesquinhas disputas, na luta pela verdade, nas mentiras infames, nas combinações com o diabo e nos monólogos com Deus.” A palavra pode ser boa ou má dependendo de quem a usa. E ela sempre traduz aquilo de que o coração está cheio. Usar sempre uma palavra boa ou bem colocada são jeitos leves de se relacionar. Quem nunca guardou para sempre uma palavra boa dita por alguém? Quem se esquece da palavra doce da professora de nossa infância, ou do conselho terno da mãe? E a palavra do amigo naquela hora de grande dor ou de grande alegria? No dia a dia, muitas palavras boas ouvimos e dizemos estabelecendo uma ponte de simpatia. Repito sempre as palavras do grande escritor Bartolomeu de Queiroz: “Sou frágil o suficiente para uma palavra me machucar, como sou forte o suficiente para uma palavra me ressuscitar.” Mesmo porque a palavra dita não tem volta, depois de falada é levada pelo vento por esse mundo de meu Deus. À medida que usamos palavras otimistas e afetuosas, o nosso ser, também, vai se impregnando delas.
A maior parte dos meus desafetos foram plantados pela palavra mal dita ou maldita. E a palavra que nos fere aguça uma resposta também má. O primeiro ímpeto é responder com a mesma agressividade, o que forma uma sequência de inutilidades. É muito difícil segurar as emoções e não nos defender quando somos atacados. Como não devemos guardar mágoas para não nos prejudicar, o remédio é colocá-las à margem do coração e justificar com palavras de consolo da filosofia “que nunca ajudou a fazer bons negócios, mas ajuda a suportar os prejuízos.”
A outra face da moeda de ouro é o escutar. A escuta nos faz melhores. Como já disse o escritor e professor Rubem Alves, somos mais amados quando sabemos escutar alguém do que quando lhe falamos. No entanto, a escuta, para ser proveitosa, não pode ser mecânica como se apenas estivéssemos do lado sem participar com interesse. Aquele que sabe escutar doa-se por instantes. E pensar que se fomos escolhidos para ouvir é porque fomos merecedores de confiança, fomos os braços escolhidos para amparar ou fomos o riso escolhido para compartilhar contentamentos.
Volto meu pensamento para o sacerdote na incansável tarefa da escuta. Quanto bem ele faz em escutar, sem pressa, sublimando, muitas vezes, a árdua missão de atender com desvelo mil confissões e outros tantos conselhos e direções espirituais.
Os profissionais, como os médicos, que através da escuta exercem o verdadeiro sacerdócio para curar. E ao ouvir as queixas para pedir exames e fazer o diagnóstico, ainda descobrem a lágrima oculta, que são os sofrimentos da alma provocadores de tantas doenças psicossomáticas.
Atualmente, a vida corrida, e cheia de incertezas, tem nos feito distantes das duas faces da moeda de ouro. Tem sido difícil vigiar as palavras em meio a tantas desavenças, como também quase não encontramos tempo para ouvir desabafos, alegrias dos outros e mesmo um papo de encurtar caminhos. Esquecemo-nos de que a palavra que sai de nós abençoa-nos com seu eco. E escutar as pessoas engrandece o conteúdo humano porque as experiências dos outros são lições e exemplo. Depois de ouvirmos as pessoas que necessitam de nós, uma sensação de bem-estar e graça se apodera de nós.
Que Deus nos dê a sabedoria de usar dos talentos recebidos dEle. Não enterrá-los, mas fazê-los multiplicar.
* Marilene Godinho, escritora e membro da Academia Caratinguense de Letras