A campeã Lorena Lourenço conta como o taekwondo modificou sua vida e apontou o caminho para um futuro promissor
TARUMIRIM – Ela ainda está na adolescência, a fase das descobertas. Mas aos 15 anos, Lorena Lourenço Ferreira já descobriu algo importante: tem potencial para ser um dos maiores nomes do taekwondo brasileiro. E os títulos alcançados, como os obtidos recentemente no Grand Slam, provam que ela está certa. Como recompensa por tanto talento, hoje integra a seleção brasileira júnior e se prepara para representar o país no campeonato pan-americano, que acontecerá no final de agosto, na Costa Rica. A reportagem do DIÁRIO esteve em Tarumirim e conversou com a atleta, que treina na Academia Tubarão de Taekwondo. Ela contou um pouco de sua vida, falou de seus projetos e mostrou mais uma vez que o esporte é um agente transformador.
Você poderia falar um pouco sobre sua infância?
Sim. Fui criada com minha mãe e pai juntos. Somos eu e mais cinco irmãos, sem contar uma irmã que morreu e outra que não mora mais com a gente. Meu pai e minha mãe se separaram no ano passado, moro com meu pai e minha irmã mais nova. Comecei treinar com quase 10 anos. Desde que nasci fui criada aqui em Tarumirim, faço taekwondo há quase seis anos.
Sua família sempre te apoiou para a prática do taekwondo?
O que mais entristece é a separação da minha família. Meu pai me apoia, me acompanha em tudo; mas minha mãe não. Quando estavam juntos começou a dizer que luta não era coisa de menina, mas não proibiu. Sou a xodó para meus irmãos. Um irmão que não mora aqui fica muito feliz com minhas vitórias, mas para os outros nem tanto, não sei se não sabem demonstrar sentimentos. Meu pai também não demonstrava.
Como conciliar escola com o taekwondo?
Estou no 1º ano do ensino médio. Tenho em mente continuar nos esportes, não pensei em outra profissão. Tinha sonhos, mas não esperava chegar longe tão rápido. Taekwondo hoje é praticamente minha vida, porque o dia tem 24 horas, 17 são para dedicação ao esporte. Participei do campeonato brasileiro algumas vezes. Consegui vencer um desses campeonatos e foi medalha de bronze em outro. Agora muita responsabilidade com o campeonato pan-americano. Na minha categoria, que é júnior até 59 quilos, apenas eu faço parte da delegação brasileira. Então, o taekwondo é rotina, minha casa, vivo este esporte; só não treino mais porque tem a escola. Nas férias meu pai só me vê em casa quando vou dormir, a maior parte do tempo é dedicada ao treinamento.
Você é muito querida e reconhecida em Tarumirim. Como se sente tendo todo esse apreço?
O reconhecimento por parte das pessoas é muito bom, aumenta a autoestima, faz com que a gente busque mais. Meus amigos ficam felizes com minhas vitórias. Treino com Flávio (Furtado da Rocha), que é como um segundo pai pra mim. Somos muito próximos.
O que é mais importante, vencer ou fazer uma boa luta?
O que me deixa feliz é fazer uma boa luta, como o mestre Flávio diz ‘o importante não é vencer, mas convencer’. Às vezes você pode ter perdido uma luta por alguma falha, mas pode ter lutado muito.
Qual luta mais te marcou?
A luta que mais me marcou foi quando era faixa colorida ainda, perdi, mas fiquei feliz, porque no meu ponto de vista lutei demais, não valia chute na cabeça, mas chutei a cabeça da menina, mas como foi a primeira vez, fui desclassificada, pé subiu sem querer. Mas como ela era muito graduada, fiquei feliz. Foi em Ouro Branco, pelo campeonato mineiro. Daqui pra frente espero muita coisa, tipo olimpíadas, mundial e daí pra lá. Preciso de muito foco, quero ser a melhor lutadora do mundo.
Que conselho daria para a sua geração?
Alguns vão para o caminho errado por falta de apoio. Felizmente eu tenho responsabilidade. A maioria pensa que se não tem apoio, deve fazer algo de errado, pois ninguém vai notar. A mensagem que deixo é não se levar por coisas ruins, as pessoas podem não ligar pra você, mas Deus escreve a história da gente.
SUPORTE
Para chegar a esse patamar, Lorena Lourenço conta com o suporte de empresários, da escola e de seu treinador. A reportagem conversou com essas pessoas, que enalteceram a capacidade e dedicação da atleta.
“Para nós é um privilégio muito grande poder patrocinar a Lorena, que representa até mesmo a ascensão da nossa empresa. Uma menina humilde, que começou na base, e está se destacando no esporte. Pelo esforço dela já tínhamos uma expectativa que chegaria nesse nível e esperamos que consiga uma medalha internacional para trazer ao nosso Brasil, representando o município de Tarumirim. Acompanhamos o trabalho do mestre Flávio há vários anos, tanto é que estamos patrocinando através dele. O Flávio está conosco no município há mais de dez anos, uma pessoa humilde, dedicada no esporte, faz o possível e o impossível e acredita nas pessoas, isso é muito importante, uma pessoa disciplinada, de ética”.
Elson Nei da Silva – empresário
“Para nós é uma honra patrocinar Lorena e aqui na cidade não vejo as pessoas darem muita importância ao esporte, mas vemos como um momento único para ela. É um investimento para os dois lados e as pessoas deveriam valorizar a questão de ser patrocinador, principalmente uma pessoa humilde como ela, um atleta que está chegando longe”.
Eliane Cristina Alves Silva, empresária
“Falar da Lorena é uma tarefa fácil. Uma menina muito disciplinada, educada, chegou a nossa escola esse ano. Tem se destacado não só no esporte, mas dentro do ambiente escolar, tem aprendido muito na academia com o mestre Flávio. A escola tem buscado apoiar o esporte e temos o prazer de ter a Lorena. Temos alunos que querem ser como ela, chegar à seleção nacional. E muita alegria poder fazer parte disso, tem sido muito bacana. Esporte na escola ganhou outra dimensão através de sua vinda”.
Silvânia Mercês Almeida Beltrame – diretora da Escola Estadual Maria Teixeira da Fonseca
MESTRE FLÁVIO
Lorena é treinada por Flávio Furtado da Rocha, que há 21 anos ensina taekwondo. Mestre Flávio conta que sua academia é um projeto para dar oportunidade aos jovens, ou seja, “ver uma luz ao fim do túnel, 60% dos alunos são carentes, não podem comprar uniforme e pagar a mensalidade, nos contamos com ajuda principalmente de Deus que tem nos iluminado e nos dado força para continuar trabalhando. Em nossa academia não temos apenas um aluno bom, mas uma equipe maravilhosa. Hoje contamos com os melhores de Minas. Tem agora a Lorena que participará do pan-americano em Costa Rica, além do Maycon, que foi campeão estadual”.
A respeito da expectativa para o campeonato pan-americano, mestre Flávio comenta que Lorena vai para o seu primeiro torneio internacional, mas ele acredita que a jovem atleta tem potencial para chegar às olimpíadas. “A Lorena, como atleta, vem me surpreendo a cada dia. Acho que os grandes divisores de águas dela são a perseverança, disciplina, confiança em Deus, mesmo com todas as dificuldades que a vida impõe, ela é uma guerreira Com certeza uma das alunas que mais treina, acredita no seu potencial. Na realidade ela disputou alguns torneios, ano passado ficou em 5º lugar no ranking nacional que deu vaga par disputar o Grande Slam, torneio entre os melhores atletas do Brasil. Em nossa academia tivemos três atletas disputando e a Lorena foi campeã no fechado, e ganhou a vaga. É a realização de um atleta, de uma academia, de uma cidade, de um estado. Nos últimos instantes já não estava aguentando de felicidade”.
Como é uma atleta de primeiro nível, os custos são altos e mestre Flávio pede mais incentivo. “A Lorena conseguiu apoio do pessoal da Cobra Veículos, mas precisamos de apoios mais concretos, pois os gastos são muito grandes. Por ser uma cidade pequena, não tem tanto valor. Sem apoio fica quase inviável. São muitos gastos para ir a Costa Rica. Lorena tem possibilidade de estar nas olimpíadas de 2020, mas teria que participar de muitos torneios. Não temos a equipe multidisciplinar para dar o suporte necessário, temos feito muito por nossa estrutura tão pequena”.