José Carlos Cerqueira, diretor da Rádio Cidade, faz análise do devido papel dos meios de comunicação
O jornalista Cláudio Abramo (1923/1987) já afirmava acertadamente que o jornalismo é o exercício diário da inteligência, é a prática cotidiana do caráter. Ele pregava também que não existia uma ética para o jornalismo e outra para esta ou aquela profissão: “Sou jornalista, mas gosto mesmo é de marcenaria. Gosto de fazer móveis, cadeiras, e minha ética como marceneiro é igual à minha ética como jornalista – não tenho duas. Não existe uma ética específica do jornalista: sua ética é a mesma do cidadão”.
Baseados nos princípios de Abramo, os jornalistas Diogo Oliveira Nonato e Joscivanio de Jesus escreveram para o Observatório da Imprensa um artigo onde afirmam que os profissionais da Comunicação seguramente não cometeriam abusos como o da Escola Base, acontecido em março de 1994, “quando vidas foram destroçadas pelas informações mal apuradas de uma imprensa irresponsável, tudo em nome de uma falsa moral em defesa da população”. Na ocasião, os donos da escola e dois funcionários foram acusados injustamente de molestar alunos na faixa etária dos quatro anos de idade.
A imprensa muito fala da moral e da ética, mas fazendo um mea-culpa, costumeiramente não segue esses princípios. Como estamos em ano eleitoral podemos fazer um paralelo com os grandes jornais norte-americanos que durante a campanha são isentos na cobertura, dando o mesmo espaço para cada candidato, mas em seus editorais declaram abertamente apoio a determinado político. Mas no Brasil acontece o inverso, as publicações tentam se mostrar isentos ou imparciais nos editoriais, mas acabam tendenciosas na cobertura.
E como o assunto desta matéria é moral e ética na imprensa, o DIÁRIO entrevistou José Carlos Cerqueira, referência na comunicação caratinguense e que dispensa apresentações. De forma concisa, Cerqueira faz a análise do devido papel da imprensa.
Em relação ao Código de Ética, o senhor acredita que ele é essencial ou dispensável ao jornalista?
Absolutamente essencial. E ganha relevância nos tempos atuais onde o profissional de comunicação é alçado ao status de guardião do interesse público, ao lado de instituições como o Judiciário e o Ministério Público. Abrir mão de parâmetros que regulam a ética na profissão é abdicar do direito e do dever de cumprir um papel cívico e social relevante.
Como o senhor pensa que deve ser a relação entre fonte e entrevistador?
De pleno respeito e sinceridade. Marcada por uma “cumplicidade” do bem.
Em sua avaliação, quais os casos mais comuns quando há falta de ética por parte de algum veículo de imprensa?
Acrescenta-se mais um grau de impotência no cidadão comum que vê na imprensa uma das últimas trincheiras da decência e da cidadania.
Tudo é justificável em prol do interesse público?
Isso é relativo. Depende do “tudo” e do “interesse” público.
O que o senhor pensa sobre as reportagens feitas através de câmeras e gravadores escondidos?
Se servem a uma boa causa ganham legitimidade. Se atendem a interesses escusos, obscuros caem na vala comum dos mal feitos.
É possível estabelecer limites éticos claros sem cercear a atividade jornalística?
Parâmetros são sempre necessários em qualquer atividade social. Mas é preciso respeitar a relatividade de cada situação. É uma abordagem delicada.
Agora vivemos um período pré-eleitoral. De modo geral, a imprensa é isenta na cobertura política ou deixa que as convicções ou interesses falem mais alto.
Não existe a isenção absoluta. Nem na imprensa nem em qualquer outra instituição. A tendência é inerente ao humano.
O senhor atua na imprensa há muitos anos. Mudou a ética jornalística nesse período, ou seja, o que antes era inadmissível, hoje é tolerável?
De maneira geral houve avanços. Principalmente porque o discernimento do público é muito maior. Ninguém é tão ingênuo a ponto de se deixar influenciar sem questionamentos. A internet ajudou muito nesse quesito. Mas o risco ético continua existindo. É bom o cidadão que se informa pela mídia ficar atento.